... ou pelo menos comece a ter noção de quem é você.
Nesses últimos meses de sumiço desse espaço (um único post), eu engrenei numa daquelas viagens de auto-conhecimento que pra mim, bom, eram apenas assunto de filme adolescente onde a mocinha acorda um dia cansada de tudo, resolve despirocar e toca um foda-se geral. E daí que sexo, drogas e rock and roll na veia e aquela coisa toda... e no final, alguma lição sobre si mesma.
Bom, não foi exatamente isso que eu fiz. Aliás, fiz coisa bem diversa. Estava em crise existencial e gritando a plenos pulmões pra quem quisesse ou não ouvir que eu não aguentava mais Popeland City, a gente de mentalidade tacanha que aqui reside, a minha vida profissional, sentimental, familiar e o fato de que pandas não fazem parte da fauna valeparaibana. E em como todo surto obsessivo que me acomete, decidi que seria legal morar em outra cidade e tentar ter uma outra vida. Destino: São Paulo.
E aí eu ergui minha bandeirinha, fiz mil propagandas, discuti inúmeras vezes que seria melhor pra mim por a+b morar na cidade grande até que decidi ir mesmo... e fui. E foram os 6 meses mais estranhos de toda a minha vida - é, estranhos, não ruins.
Sair da casa em que morei com as mesmas pessoas desde que nasci foi o primeiro baque. Passei um bom tempo acordando com o pensamento de que tudo era temporário até me acostumar e conseguir falar com segurança que eu não morava mais em Paris-Texas City, e que o apê na Rua da Consolação era a minha morada de fato. E embora toda a estrutura de casa de família e não de uma república, nunca consegui enxergar como lar ou minha casa. Seria trair tudo que eu amava, mais ou menos como arrumar um amor pra esquecer outro. Então, nada de lar ou minha casa, eu apenas morava no apê da Consolação.
Outro ponto importante é o fator morar com estranhos. Não, eu não morei com estranhas - muito pelo contrário, morei com amigas queridas que conheço há muito tempo, coisa que me ajudou demais e que vou ser grata a elas até o fim dos meus dias. Mas conviver esporadicamente não é conviver debaixo do mesmo teto, então... como em todo processo de adaptação, rolaram discussões, muitos momentos alegres e surpresas, afinal, cada um tem uma história e visões diferentes sobre o mesmo tema. No final você se descobre mais tolerante e vê que muitas verdades que são absolutas pra você, não fazem diferença na vida dos outros e vice-versa.
Uma outra coisa foi que... pela primeira vez tive que me deparar comigo mesma. E ter a total responsabilidade sobre mim mesma em todos os âmbitos. E o que pesou não foi administrar a minha montanha-russa emocional, e sim coisas banais, como pensar no que é que eu ia jantar quando chegasse em casa (coisa que descobri que toma muito tempo quando se é independente) ou pensar no que é que eu ia fazer depois do serviço (no geral, passar no bar do Zé, pegar algumas geladas e ir fazer o jantar).
O frio e a correria de São Paulo quase me mataram. O primeiro porque, bem, eu estou acostumada ao calor senegalesco de Popeland City e eu peguei o inverno todo lá. De repente, um guarda-roupa onde só havia tops e no máximo uma jaqueta quente, estava abarrotado de meias grossas, blusas de lã de gola alta e coisas afins; não me lembro de um dia sequer em que eu tenha saído vestida como a mamãe ursa e que não tenha passado frio mesmo assim. Já a segunda... eu não aguento gente estressada, correria, caos. Não dá pra passar incólume a loucura de uma cidade em que as pessoas andam no ritmo da abertura dos semáforos. Me lembro de estar andando em Popeland, e, de repente o acompanhante virar pra mim e falar "Mas, Mari, por que é você está correndo?". Eu que sempre fui slowmotion, de repente tinha me tornado uma pessoa acelerada. E o pior, não tinha me dado conta disso.
Quanto a questão vida social... bem, foram 6 meses de vida social quase nula e nada de gatinhos paulistanos. Saí raras vezes; em compensação nos finais de semana a vida fervilhava no interior. Chegava na casa de Paris toda sexta à tarde e ficava só o tempo necessário para comer, trocar de roupa, colocar a conversa em dia e fazer meia dúzia de ligações que garantiam programação até domingo a noite. Voltava pra São Paulo toda segunda no primeiro ônibus... às 4:20 da manhã, muitas vezes ainda de porre e sem dormir o final de semana todo, motivo pelo qual todo mundo me chamava de louca(hoje eu vejo que eles tinham razão, ônibus às 4 da manhã só em caso de extrema necessidade mesmo).
Se você leu até aqui, deve estar pensando no que afinal aconteceu de bom nessa viagem... pois é, eu também levei tempo pra absorver o lado positivo, ou melhor, pra me dar conta de que havia um. Sempre fui adepta de levantar a bandeira de que liberdade e felicidade não são questões de situações impostas pela vida ou de estar em determinado lugar, e sim questão de como você enxerga e lida com isso tudo. E essa viagem nada mais foi do que a prova de que eu havia caído em minha própria armadilha, a de ter condicionado a expectativa de felicidade e minha liberdade a uma situação. E ao final me dei conta de que ambas não estão aqui em Popeland City também, pelo simples fato de que estão dentro de mim. E sim, sou mais feliz e cada vez mais livre nesse fim de mundo, porque consegui me libertar do estigma de que as situações fazem você. E porra louca, culta, sociável, estável, feliz ou qualquer outra coisa que seja... eu posso ser aqui, lá, ou em qualquer lugar. Escolhi voltar e ser aqui, e aos olhos alheios... se você foi pra São Paulo e voltou, é porque não deu certo. Outro estigma cadelo e falso, mas aí isso quem pensa são os outros. E o que os outros pensam, é problema deles. Então, o que me resta é pedir licença pra ir ali continuar sendo livre e feliz. Que isso sim, é problema e objetivo meu.