28 fevereiro 2007

Jimi

Não, não é o Hendrix. Jimi é meu novo gato de estimação, um mestiço siamês que apareceu aqui há dois dias, aparentemente sem dono até o presente momento. Calculo que ele tenha entre 2 e 3 meses, é dócil e já chegou chegando. Nas duas primeiras horas de convivência já descobriu onde era o banheiro, onde ficava a comida dos outros gatos e o principal - as camas. Jimi é a preguiça em forma de felino - enquanto outros felinos bebês adoram fazer estripulias, arranhar os móveis e correr pela casa, Jimi só come, ronrona e dorme. E como todo bom felino, é o companheiro ideal para as noites de insônia... dorme a noite toda e quando estou quase conseguindo dormir depois de vagar feito alma penada pela casa a madrugada toda, quer brincar. Comigo. De morder a ponta do meu nariz e puxar meus cabelos. E ronrona todo contente. E eu morro um pouco mais. Vida longa ao Jimi.

27 fevereiro 2007

Festa (1)

Ela não conseguia se lembrar do que havia acontecido ordenadamente na noite anterior e isso a perturbava. Estava jogada ali, na cama, há quanto tempo? Não sabia. Não sabia onde estavam suas roupas, a chave do carro, da casa. Decidiu levantar-se dali e o fez rapidamente. A cabeça pesou, as pernas bambearam, caiu desfalecida na cama. Tentou respirar compassadamente, o sangue foi voltando a circular aos poucos. Sentiu-se firme o suficiente para levantar da cama, só que dessa vez lentamente. Foi até ao banheiro, lavou o rosto na vã tentativa de recuperar a consciência - só conseguiu recuperar suas chaves que estavam em cima da pia junto com um bilhete. Leu com muito esforço, as letras embaralhavam-se em palavras sem sentido. "Lembre-se apenas dessa noite, o resto não tem mais sentido." Que noite, que resto?- puta que pariu, não se lembrava nem de como havia chegado ali, quanto mais do resto!

Voltou ao quarto, pegou uma camisa dele no guarda-roupa e vestiu-a; o corpo já começava a responder às ordens do cérebro. Foi até a sala, suas roupas estavam espalhadas por ela. Recolheu-as e decidiu ir embora, já que não havia mais ninguém ali. Entrou no elevador, onde um senhor de uns 50 e poucos anos ficou olhando para ela com uma curiosidade doentia. O que foi, vovô? Nunca viu nada parecido? pensou, - provavelmente o senhor nunca havia se deparado com uma mulher descabelada, vestindo apenas uma camisa, descalça, segurando uma muda de roupas e um molho de chaves. E para seu azar, o elevador demorava a descer do décimo sétimo ao andar térreo. Estava ficando irritada com a curiosidade dele, quando o senhor decidiu quebrar o gelo:

- Você é nova no prédio?
- Não, senhor. Apenas visitante.
- Ahn. Do 173, não é?
- Sim.
- Mais uma das festas de arromba do Alberto, não?
- É, o Beto sempre foi bom em comemorações.
- O condomínio que o diga...

O elevador parou no décimo terceiro. Uma senhora com uma criança de colo entrou e a olhou com a mesma curiosidade, só que com um ar de reprovação. Cumprimentou ela e o senhor grisalho e permaneceu calada, ninando a criança. O senhor voltou-se para ela:

- Mais uma das festas do Alberto ontem, você percebeu?
- Só ouvi um buchicho quando a polícia apareceu. Mas é o habitual, não é?
- É. Esses jovens...
- Bom, pelo menos teremos assunto para a próxima reunião no condomínio.

Ela observava os dois e só pensava que queria estar em outro lugar. Povo mais desprovido de vida própria, pensou. Sua cabeça doía demais para dizer qualquer coisa aos dois, mas sua memória já tinha voltado ao normal. E pensava em nunca mais voltar ali, pelo menos não sem usar uma peruca e óculos escuros para não ser reconhecida - a situação em que se encontrava naquele elevador era vexatória demais. Sobre o Alberto, só conseguia se lembrar de quão canalha ele era, de quantas vezes ele a tinha feito esperar sem aparecer, ligar ou se desculpar depois. Pensava em quanto gostava dele e em quanto era masoquista; se sentia miserável por isso, mas tudo mudava quando ele aparecia no escritório trazendo flores e a convidando para jantar.

No dia anterior, Alberto havia combinado com ela que haveria uma festa no apartamento dele para comemorar uma promoção que havia conseguido; a pegaria no escritório no final do expediente. Como sempre, ele não chegou no horário combinado e ela ligou dizendo que não precisava mais ir buscá-la, ela iria para casa e depois para o apartamento dele. E assim ela fez.

Quando chegou, todos os amigos dele e alguns em comum estavam lá. Havia muita bebida, um som rolando ao fundo, abafado pelas conversas animadas e alguns petiscos. Ele estava muito feliz e a abraçou, disse que naquela noite estava especialmente bonita e foi logo apresentando ela a todos que ainda não a conheciam. E ela passou a noite toda entre uma conversa e outra, todas regadas a muita vodca com gelo e limão - sua bebida preferida -, enquanto ele se desdobrava para dar atenção a todos, inclusive para ela, o que era um pouco atípico, mas era dia de festa.

No meio da noite, Alberto foi chamado por um dos convidados para resolver um problema lá na portaria do prédio - um casal havia bebido demais e o marido discutia com a mulher porque um outro convidado estava se insinuando para ela; esse convidado interviu, dizendo que estavam só conversando e que não havia nada demais, quando levou um murro certeiro no rosto e caiu, zonzo. Quando Alberto chegou na portaria, os dois homens se engalfinhavam e a turma do deixa-disso estava tentando apartar a briga, sem muito sucesso. E antes que a briga se tornasse uma confusão generalizada, uma viatura da polícia militar apareceu na portaria do prédio, havia sido chamada por um dos condôminos. Os ânimos se acalmaram, e depois que explicaram o ocorrido para os policiais, os convidados briguentos foram embora e tudo voltou ao normal. Quando voltou ao apartamento, Alberto a viu conversando animadamente com dois amigos seus do serviço e deu um jeito de tirá-la dali. Ela percebeu o ciúmes e sorriu por dentro. Passou o resto da noite na companhia dele.

Os últimos convidados se foram no meio da madrugada e os dois ficaram a sós no meio dos restos da festa. Alberto percebeu que ela havia bebido um pouco demais e não a deixou pegar as chaves do carro; na manhã seguinte poderia ir embora, quando já estivesse melhor. Ficaram conversando sobre futilidades até o momento em que ela mudou o rumo da conversa para os dois. Ele disse que a amava e que pretendia ficar com ela enquanto aquele sentimento durasse. Ela rebateu dizendo que não sabia que tipo de amor era aquele, em que só ela se doava e ele só recebia. Acabaram discutindo e ela decidiu ir embora. Quando estava saindo do apartamento, sentiu ele a pegar pelo braço com força e o mandou soltar. Ele não o fez e puxou-a para si. Beijou-a.

Arroz e feijão...

- Então, o que você acha?
- Não sei. Sabe quando a gente come a vida toda o feijão por baixo do arroz? Então...
- Então...
- É, então... é isso.
- Medo de mudar? Um dia as coisas têm que acontecer.
- Eu sei. Mas por enquanto não... prefiro o feijão por baixo do arroz.
- Tá. Deve ser o melhor, mesmo.
- É...

25 fevereiro 2007

Fim

Um dia nos deparamos com ambos extremamente entendiados conversando sobre futilidades no meio da madrugada. Não via a hora de você me dizer que estava cansado e que iria para a cama, estava cansada de nossas conversas. Não que eu fosse uma pessoa com conteúdo, mas naquela altura do campeonato, nossas futilidades eram exaustivas pra mim porque acabavam a única coisa que nos mantinha relativamente unidos. E você estava tão cansado disso quanto eu; cansado também dos meus habituais chiliques e idéias fixas tolas. Estávamos em um ponto em que todo o resto da relação não compensava esses momentos de tédio, em que um nunca sabia o que dizer para o outro, em que não sabíamos mais nada, só que estávamos cansados. Cansados da companhia um do outro. E naquela noite você foi se deitar... sem beijos de despedida, sem boa noite, sem palavras. Não queria acreditar, mas já tinha me dado todos os sinais... não era mais meu há tempos, talvez nunca tivesse sido. Assim como eu também talvez nunca tivesse sido sua de fato. Mas eu nunca iria te dizer que não dava mais, que pra mim também não fazia sentido. Não costumo admitir que as coisas dão errado às vezes e que o certo é deixar passar, deixar a outra pessoa ir. Mesmo que não ame... é doentio, eu sei. E eu não disse nada até o dia em que você me disse que não dava mais. Naquele momento eu não consegui sentir nem pensar nada que não fosse querer estar com você. Mas isso não reverteria a situação, então não disse mais nada. E o tempo correu... às vezes sinto falta do seu sorriso, da companhia, do abraço apertado. Mas a vida segue, não é? Sigo tresloucada e errante como sempre, mas por mais que fosse legal, não queria estar de novo com você, nem nos meus sonhos. Porque no final as contas, cada momento é único e nós já não somos mais os mesmos. Foi bom. Acabou.

22 fevereiro 2007

Carnaval, futebol, boxe...

Bom, eu nunca tinha me questionado, até esse carnaval, o porquê de sempre tocarem hinos de clube de futebol nos bailes, na rua e etc. em pleno carnaval. Ritmos novos, funk e tal, tudo bem... mas hinos de clube de futebol? Bem, não obtive resposta. Aliás, nem perguntei, era carnaval. A segunda melhor festa do ano na minha opinião, já que a primeira é a Festa de São Benedito que ocorre aqui todos os anos na semana posterior à Páscoa(em outro momento comento sobre ela). Mas enfim, carnaval é uma maravilha: quatro dias dançando, cantando e bebendo. E feliz. E morta na quarta-feira de cinzas - claro!, ninguém é de ferro.
Mas voltando aos hinos, fiz uma triste constatação. Sou tricolor desde pequena, e bem, costumava ser fanática, de ler o caderno de esportes e tudo mais. Sabia o nome de todos os jogadores da era Telê, do Bi-mundial. Telê, Raí, Muller, Zetti e Leonardo eram meus pastores e naquela época, nada me faltou. Na época eu tinha uns 10-11 anos e era companheiríssima do meu pai pra todas as partidas, pra xingar o juiz e a genitora dele e etc. Mas em algum momento na adolescência, deixei de me interessar tanto por futebol - outros interesses foram surgindo, mas sempre acompanhava mais ou menos os resultados. E bem, no sábado de carnaval, quando começaram a tocar os hinos, estava lá feliz cantando quando descobri que não sei o hino inteiro do ainda tão amado Tricolor Paulista, mas... sei o hino do Palmeiras de cor! Depois que me toquei disso, fiquei puta da vida. Pô, do Parmera?? Ninguém merece. Na hora pensei no meu irmão, o único degenerado da família que ousa torcer pro Porco. E me deu raiva. De mim, dele, de toda a torcida alviverde imponente e etc. E me lembrei de dois ex, palmeirenses também, que provavelmente fariam da minha vida futebolística um inferno, se soubessem disso(que fique claro que não tive ex gambá, porque ex já é uma coisa para se deletar, e gambá, bem, sem comentários... eu não lembro, eu não tive). Depois que a revolta passou, bem, decidi baixar o hino do Tricolor e decorar, pra ver se a vergonha passa. Sim, vergonha. É como não saber o samba enredo da escola do coração no carnaval - Mangueira, no caso. E voltar a assistir jogos de futebol como antes; agora me lembro um dos motivos de ter parado de assistir futebol - eu sou aquele tipo insuportável que grita o tempo todo do jogo na frente da tv. Meu pai geralmente perdia a paciência e mandava eu sair da sala em sinal de protesto aos meus gritos(não é legal ouvir a filhinha gritando "Caralho, rola essa porra dessa bola logo!"). O mesmo acontecia nas lutas de boxe(como eu amava o Tyson...), mas elas eu ia assistir sozinha no quarto e gritava feliz do mesmo jeito; já o futebol... bem, esse não tinha(ainda não tem) graça assistir sozinha - assim como o carnaval. Não há como ir sozinha pra folia. Mas enfim, para tudo há solução. Nem que seja baixar o hino do time e decorar.

Conversa preventiva

- Vi meu ex na avenida, no sábado.
- O André?
- É, tá solteiro...
- Como assim??
- Solteiro, ué. Tava com os amigos lá.
- Mas como é que você sabe?
- Orkut, ué.
- Ahn...
- Pois é, largou a outra lá.
- Viu, você não vai encostar nele!!!!!!!
- Ei, mas eu só...
- Tá me ouvindo??? Você não vai chegar perto dele. E o mais importante: não vai deixar ele encostar em você!!!!!
- Mas... eu só vi ele, nem nos falamos mais. Calma, pelo amor de Deus!
- Eu tou calma! É só bronca preventiva, oras.
- Mas eu...
- Mas nada, é pra pensar antes de fazer.
- Mas eu nem tava pensando em nada. Eu só vi e ponto.
- Não tem problema, é bronca preventiva. Só preventiva mesmo.
- Então tá. Nem tava pensando em fazer merda...
- Ãrrã...

16 fevereiro 2007

Preocupante

Há muito tempo deixei de assistir telejornais por motivos simples: o sensacionalismo é algo extremamente irritante e é exaustivo ligar a tv e ver a mesma notícia de um modo diferente durante vários dias, geralmente explorando a desgraça alheia. Acho isso extremamente degradante, ao passo que, bom, outras matérias que poderiam ser interessantes realmente não costumam render ibope. Outro motivo é que sempre preferi a imprensa escrita e convenhamos, há todo um ritual para se ler um jornal diariamente ou uma revista, e o ritual costuma ser bastante prazeroso para quem gosta, que é o meu caso. E há também os sites dos jornais com notícias novas todo minuto - acho que a vantagem, além da atualização mais que constante, é o fato de a notícia vir enxuta, sem floreios, rodeios. E se você não sabe direito do que se trata a notícia, bom, é só clicar no link abaixo para notícias anteriores relacionadas. Muito prático.
Ainda, em se tratando da imprensa de modo geral, há a questão das notícias serem tendenciosas ou não. Sempre vejo alguém comentando que "Ah, você lê a revista X? Essa revista é um lixo, é tendenciosa e etc...". Particularmente, não acredito em imprensa imparcial, porque de uma maneira ou de outra, todo meio de comunicação serve para expressar as suas idéias, então nada mais natural que puxar a sardinha para o seu lado, por mais que se tente ser imparcial - é algo intrínseco do ser humano. O que acho condenável é simplesmente não ler algo por esse motivo, como se você ao ler, fosse ser contaminado por algum mal. É como só ouvir um tipo de música e falar mal do resto, como se aquela fosse a única opção, e não é bem assim. Acho que você constrói suas opiniões através de várias outras, e para ter uma idéia formada é interessante que se leia os dois lados da história(tendo consciência de que cada uma vai emitir uma opinião voltada para o seu lado) e a partir daí sim, construir o seu próprio pensamento. A revista X ataca fulano de tal? Ótimo, que bom que sei disso, mas vou ler do mesmo jeito. A Y defende? Bom também, vamos ver o que ela tem a dizer. Considero esse exercício muito saudável, no final das contas, você acaba separando o joio do trigo.
Sobre a tv, bem, o escarcéu que fazem é digno de pena. Eu sou a favor de que cobrem atitudes das autoridades competentes(mesmo porque acredito que isso seja uma das funções sociais da imprensa), mas não precisa fazer um circo em torno disso. E além disso, há os absurdos que falam sobre a polícia e a justiça no geral. Claro que há deficiências em ambas instituições, mas não se pode generalizar nem dizer coisas sem saber do que realmente se trata. Se um policial mata alguém, a polícia toda não presta. Se a justiça não condena um possível culpado, é ineficiente. Esse tipo de coisa faz com que eu realmente prefira ler um jornal, a notícia na internet do que ver tv. Fora o fato de todos os telejornais serem muito parecidos - o que é entediante-, os sensacionalistas, os da madrugada, os do horário nobre... todos muito iguais.
Acerca disso tudo, o questionamento que surge é: como é que fica uma pessoa comum diante de tudo isso? Dessa avalanche de informações, tendenciosas ou não, sem a mínima noção do que realmente acontece ao seu redor e sem cultura suficiente para discernir o que é bom do que não é?

É... preocupante.

15 fevereiro 2007

O Buquê...









... Enquanto esperávamos a saída da Serenata, ficamos na Pça de São Pedro, olhando as pessoas, comungando da atmosfera musical e sentindo o cheiro de jasmins, muito comum em minha Olinda. E foi então que demos conta do casamento religioso que estava sendo celebrado na igreja de São Pedro... Quando os noivos [agora marido e mulher] saíam e recebiam a chuvarada de arroz, começamos a aplaudi-los... Beijavam-se amorosamente nos degraus da secular igreja sob nossa chuva de aplausos e assovios... Ô povinho que não se manca, esses sem-convites... Mas estávamos contentes e torcendo pela felicidade do casal, que repentinamente começaram a interagir com a inesperada platéia que não foi convidada... A cada beijo, mais gritos e apalusos... Quando quase entrou no carro, a noiva desistiu e decidiu jogar o buquê para os espectadores... Quando olho pra cima, deparo-me com um belo buquê de rosas vermelhas, vindo, vindo, vindo... Em minha direção... E agora? Só dei um passo pra esquerda [sempre à esquerda] levantei os braços... E o buquê estava em minhas mãos... No melhor estilo 'vai que é tua Taffarel'... Em seguida, uma legião de mulheres histéricas, enlouquecidas vieram pra cima de mim com tudo... E ótima jogadora de 'handbol' que fui, dei um belo drible naquela manada de loucas... E fiquei com o buquê... Óquei, admito que algumas rosas se despetalaram diante da truculência daquelas insanas... O que a mulherada não entendeu é que eu não estou à caça de um marido... O buquê veio até a mim sem esforço algum de minha parte... Disse-lhes com meu ar de deboche: podem ficar com o marido que porventura seria meu... Eu quero mesmo é o buquê, afinal eu NUNCA peguei um buquê na vida... Nunca havia tido um em minhas mãos. Nem meu, nem de ninguém... Agora sim, posso dizer que já peguei um buquê. Marido? Obrigada, ainda é cedo pra outro... Será que uma mulher não pode em vez de desejar um marido, ambicionar um buquê? Mas e o buquê? Ah, [d]esse eu não abri mão...

14 fevereiro 2007

De noite, na cama...

Abraçou-a e acariciou seu rosto, ouviu-a dizer qualquer coisa que ele não entendeu.
- O que foi, querida?
- Nada, eu só quero ficar quieta.
- Cansada?
- Um pouco.
- Fiz alguma coisa errada?
- Não, só quero ficar quietinha mesmo. Me abraça.
Beijaram-se. Ela se aninhou no peito dele e logo adormeceu. Antes de adormecer, pensava nele, em tudo que haviam vivido até aquele momento, tinha sido especial. Talvez o amasse, mas isso ela pensaria depois - naquela hora só queria estar ali com ele, quieta. Talvez o silêncio fizesse o tempo parar ali.
Ele fez cafuné até ela adormecer; ele mesmo não conseguia dormir. Pensava nela, em como o deixava confuso. Por que queria ficar quieta? Será que não gostava dele? Talvez tivesse feito algo errado, vai saber...

O dilema de ser a mulher-cordeiro(béé!)

Às vezes é um saco ser muito dona do meu nariz de boneca étnica e fazer sempre o que bem entendo e todo mundo sempre achar que eu nunca tenho crises existenciais.
Às vezes é um saco descobrir que o bonitinho, diferente e interessante do momento tem a certeza de que eu não dou a mínima pra ele só porque não fico pregada no pé dele.
Às vezes é um saco passar a impressão de que sou feita de pedra simplesmente porque choro quando ninguém está vendo.
Às vezes é um saco existir e olhar pro lado e todo mundo achar a sua vida suuuuper legal!.
Tem dias que eu levanto pensando seriamente em me tornar um ente sem personalidade. Ou uma mulher-cordeiro. Sempre boazinha, amável, grudenta, chorona... affe!
Realmente, tem dias que dá vontade de pedir pra parar e descer do próprio corpo. E encontrar um novo, num cordeiro mesmo. Passar o resto dos meus dias comendo grama parece ideal.

13 fevereiro 2007

...

E aí você está bêbada, com uma insônia descomunal e vai ver tv às 4 da manhã. Sintoniza o VH1 e que clipe está passando? Morning Yearning, Ben Harper. Aí você almadiçoa a bebedeira, a sua insônia, a sua vida e o Ben também(mas esse você perdoa depois, porque é tudo de bom, de lindo e etc.) e fica deprimidíssima. E chora, porque a vida realmente não presta. E adormece com a tv ligada. E acorda no outro dia ainda se sentindo miserável e parecendo um panda com os olhos inchados, porque esqueceu de remover a maquiagem. Você liga o som e programa pra tocar aleatoriamente. Adivinha? Morning Yearning, Ben Harper. Desgraça pouca é bobagem. E, hein, o Ben ainda é tudo de bom, de lindo e etc.

Convivência

- Mas nós vamos mesmo discutir isso de novo, Marcela?
- Por que não? O que é que você esconde, hein?
- Já disse que nada! Que saco. Mulherzinha insistente...
- "Mulherzinha"? Tá vendo?! Cansei dos seus "inhas".
- Cansou mesmo? Que bom.
- É definitivo, isso?
- Isso o quê?
- Esse "Que bom".
- Entenda como quiser. De nada adianta eu dizer que não, você vai distorcer tudo mesmo.
- Distorcer? Tá, não digo mais nada.
- Vamos parar essa discussãozinha que não vai nos levar a lugar nenhum?
- Porque você nunca pode ir direto ao ponto?
- Ué, estou indo direto ao ponto agora. Quer que eu seja mais claro?
- Por favor.
- Você me tira do sério sempre, desconfia, distorce, dá sua versão dos meus fatos. Eu não aguento mais! Qual é a sua? Você gosta disso? Te excita?
- Fica lindo quando bravo...
- Estou exausto.
- ...
- Não vai dizer nada?
- O que quer que eu diga?
- Cansou?
- Eu te amo.
- O quê?
- Eu te amo.
- Ama?
- Amo. Muito.

Ele a abraçou e pensou que jamais a entenderia, mas seria melhor assim. Embora fosse doentio, não saberia como conviver com ela se fosse diferente; no fundo gostava daqueles joguinhos emocionais. Amava-a assim. Um dia se cansaria definitivamente do ciúme, da desconfiança e de todo o resto, mas enquanto isso não acontecia, era melhor parar de pensar e de tentar compreendê-la. Aquela mulherzinha era para a convivência, não para ser entendida. Beijou-a, resignado.

Love, love, love

Porque no final das contas, o amor nada mais é que uma prostituta velha que já perdeu o critério e a clientela, que sempre se encanta com o primeiro que lhe sorri na esperança de que aquele vá render alguma graninha. Bom, no caso do amor, um sentido pra vidinha vazia e sem sal que a gente leva até ele aparecer. E foder absolutamente tudo.

06 fevereiro 2007

(des)aparecer

Não o via há mais de um ano; na verdade pensava que não o encontraria nunca mais até aquela noite. Ele mantinha o mesmo jeito tímido de quando se conheceram e o mesmo sorriso sem-graça, que continuava a não inspirar nenhum tipo de pensamento nela. Cumprimentaram-se, ele a beijou, ela sorriu. Perguntou como ela estava, observou que há tempos não se viam. Ela estava completamente diferente da última vez, havia um brilho diferente em seu olhar, como se procurasse algo. Olhos de caçadora, pensou. Ela perguntou como estavam as coisas. Em seu íntimo, torcia para que ele desse qualquer resposta curta e genérica para ela encerrar a conversa com algum comentário banal. Foi o que ele fez, disse que tudo estava bem. Ela ficou aliviada e sorriu. Ele emendou dizendo que ela nunca mais havia aparecido. Ele havia deixado de ser tão previsível, pensou. Ela disse que andava sem tempo, que nunca mais tinha aparecido mesmo e sorriu. Pensava consigo que nunca mais apareceria mesmo, embora houvesse uma discreta e boa recordação do tempo que passaram juntos - somente braços fortes; no mais ele não a interessava. Ele se despediu olhando nos olhos dela, convidando-a a aparecer. Achava-a intrigante, tinha vontade de repetir a dose. Ela desviou o olhar, o beijou, disse que apareceria sim. Com um sorriso, deu-lhe as costas. E desapareceu para sempre.

Encontros

Depois de várias vodkas, Laís foi parar naquele inferninho. Naquele dia ele estava assustadoramente lotado; ela tinha a nítida impressão de que ia perder o ar a qualquer momento no meio daquele monte de corpos se esbarrando, roçando uns nos outros. Um odor fétido de esgoto se espalhava pelo ambiente, o que tornava a sensação claustrofóbica maior ainda; ela morreria e apodreceria ali mesmo. Talvez depois de alguns dias alguém achasse sua carne pútrida ali, ou talvez ninguém a notasse, no meio de tantos corpos que provavelmente putrificariam ali também.
As pessoas ali presentes riam umas para as outras, um riso quase diabólico, e dançavam. A música em si não importava, a coreografia era sempre a mesma independentemente da batida; o importante era o encontro dos corpos, as peles colando pelo suor, as bocas roçando umas nas outras, o encontro de hálitos de bebida azeda e cigarro.
Vagou perdida por ali durante um tempo incerto, tateando corpos, procurando um copo, zonza pelo barulho. Num dado momento, sentiu uma mão gelada puxando-a pela cintura com força. Sem se virar, sentiu um corpo masculino atrás de si e uma língua áspera percorrendo a nuca nua. Tentou se desvencilhar daquele corpo, sem sucesso. Era mais forte que ela e parecia que quanto mais força fazia, mais ele a dominava. Numa última tentativa de se desvencilhar e ver o rosto de quem a dominava, mordeu seus braços e sentiu seu sangue na boca, o gosto na língua, um misto do salgado do suor e de um amargo desconhecido que jamais lembraria o sabor de sangue. Sentiu suas pernas bambearem - sua resistência acabou ali -, o veneno do corpo dele a tinha tomado por inteiro e ela desfaleceu nos braços dele.

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Ele carregou aquele corpo morto nos braços por horas a fio, numa caminhada cega e sem destino aparente. Naquele inferninho ele havia deixado todo o seu passado, e o dela também. Aquele lugar nunca mais existiria para nenhum dos dois; a partir do momento em que achasse o destino, todo o esboço de vida anterior se apagaria da memória dele; a dela desapareceria junto com o efeito do veneno.
Sentiu os pés doerem, sangravam. Mas era reconfortante saber que os braços ainda eram fortes o suficiente para carregá-la. Apressou o passo, ela começava a dar sinais de que logo voltaria a si.

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Laís não sabia como havia chegado ali, mas estava num barzinho com as amigas. Elas riam desse fato, diziam que ela havia bebido demais naquela noite, mas que logo ela se lembraria. E se arrependeria, como todos os bêbados fazem. Ela sorriu para as meninas e resmungou baixinho alguma coisa incompreensível, sua cabeça latejava.
Decidiu se levantar da mesa e ir até ao banheiro, talvez lavar o rosto aliviasse um pouco. Antes de se levantar, observou bem o lugar. Era agradável, o ambiente iluminado, a atmosfera aconchegante, um saxofonista tocando no palco improvisado no meio das mesas. As pessoas conversavam animadamente, sorriam. Alguns casais se arriscavam a dançar ao som envolvente na pista. Sentiu-se animada e levantou-se em direção ao banheiro. No meio do caminho sentiu uma tontura, e para não cair, apoiou-se em uma cadeira. Sentiu uma mão macia segurando sua cintura, mas não teve forças para virar-se e ver o dono daquela mão. Teve a sensação de estar segura ali, naqueles braços que agora envolviam sua cintura. No momento em que viu as cicatrizes naqueles braços, sentiu a respiração dele em sua nuca. Sorriu. Sabia que havia encontrado a pessoa certa, mas não sabia o porquê. Virou-se: ele sorria e olhava com curiosidade para ela. Conversaram, seu nome era Marcelo e ele a estava observando desde a hora em que chegou lá. Tinha a impressão de que já a conhecia e tinha ido atrás dela justamente para perguntar isso quando ela sentiu-se mal. Ela o agradeceu e disse que o mal-estar já havia passado. Ocuparam uma mesa vazia e continuaram conversando animadamente noite adentro; ela até esqueceu as amigas, que saíram dali sem dizer palavra para não atrapalhar o momento dela. Ele a levou para a casa dele, passaram o resto da noite juntos. A primeira noite do resto da vida de ambos, que a partir dali se tornou uma só vida.