28 agosto 2007

O monstro verde do ciúmes

Gente, eu odeio sentir ciúmes. O-d-e-i-o. Se o amor me torna uma pessoa miserável, o ciúmes costuma me tornar uma pessoinha muito ridícula, mesquinha, pequena e ah... humana e vulnerável. É. Menos quando os objetos do meu ciúmes são meus pais e meus irmãos, mas bem... aí a banda toca outro ritmo, né?
Enfim, ciúmes sempre leva a gente ao ridículo. De uma maneira ou de outra: ou você expõe uma insegurança que nada tem a ver com o samba e fica com cara de tacho, ou não expõe e fica remoendo um tempão até descobrir que não tem nada a ver e ficar com cara de tacho do mesmo jeito. Eu jogo no segundo time na maioria das vezes. É claro que às vezes a gente tem que temperar, ter um ciuminho explícito e basiquinho, porque é bonitinho, fofo e tal. E mostra que você tá ali, que quer, que vê o que acontece ao redor e tal - acho válido.
O foda é quando o pequeno Yago verdinho se apossa do ser da gente e fica cutucando a consciência... "Mas será??" - o maldito diabinho parece que tem prazer em atentar até você ceder e pensar que tem alguma coisa errada mesmo. E aí vem uma série de neuroses descabidas acerca do seu objeto de desejo... uma coisa boba vira uma situação toda e às vezes você acaba vendo chifre em cabeça de cavalo mesmo (na maioria das vezes, pra desespero geral das pessoas que têm alguma noção do quão isso é incômodo). Aí você discute, arma um forfé, atazana a pessoa até ela explicar por a+b que não é nada disso, e fica invariavelmente com um neon vermelho piscando na testa "Idiotaaa!". E dependendo do nível do estrago, você pede desculpas, fala que não vai mais acontecer enquanto o little green Yago se refestela e ri na sua cara, porque ele conseguiu o que queria.
Dia desses, o diabinho se apossou da minha pessoa, confesso. E eu fiquei remoendo um lance que achei meio atravessado umas duas semanas sem dizer palavra. Até ver por a+b que não era nada disso. E que o malditinho tinha pregado mais uma peça, e que sim, uhuuu!, eu sou ridícula. No final, era uma coisa tão tosca e descabida que só consegui rir de mim mesma. E mandar o pequenino ser ir passear bem longe. Até ele resolver voltar e atazanar de novo, porque no final... somos todos humanos e vulneráveis mesmo...

24 agosto 2007

Tempo

E pintava as unhas do pé cuidadosamente de vermelho enquanto pensava no que faria aquela noite. Tinha mais algumas horas para terminar de se arrumar, pensar onde iria e com quem. O dia estava muito quente e prometia uma noite ótima para se soltar, paquerar, dançar e rir muito.
Observou os próprios pés após terminar a sessão pedicure: estavam perfeitos, embora ela os achasse um tanto grandes e largos demais para pés de mulher; lembrou-se de que ele costumava gostar deles - até demais na opinião dela, mas não com unhas pintadas de vermelho. Achava unhas vermelhas vulgares, principalmente naqueles pés que ele gostava tanto. Riu e olhou para o relógio, estava na hora de tirar a tinta dos cabelos.
Debaixo do chuveiro, pensava em quantas vezes havia se deparado com ele ali, apertando o corpo dela contra a parede, mordendo a nuca ou tirando o xampu dos olhos dela, a espuma do corpo. Quando havia terminado de enxaguar os cabelos, ouviu o telefone tocar e saiu enrolada na toalha, deixando um rastro d'água pela casa.
Era Luciana dando as coordenadas da noite. O esquenta seria na casa de Aline, e de lá iriam para uma danceteria, com mais umas outras amigas, seria perfeito. Desligou o telefone e se deparou com o espelho do guarda-roupa: seus cabelos estavam no tom certo de castanho, sem nenhum vestígio dos fios avermelhados de antes, só precisavam de um secador e uma escova. Tirou a toalha e observou o próprio corpo no espelho, estava menos cheia de curvas. Pensou que até o sofrimento tinha algo de bom, principalmente a inexistência de jantares regados a vinho e os bombons que ele costumava lhe trazer.
Vestiu um pijama e ligou o som... it's so much better when everyone is in... are you in? e seguiu cantarolando Incubus, enquanto procurava a roupa certa para a ocasião. Depois de muito procurar e de bagunçar tudo, acabou resolvendo por usar uma bata frente-única preta, jeans sequinho e um par de sandálias pretas, salto alto e finíssimo. Olhou novamente no relógio, já não tinha mais tanto tempo assim para enrolar e as amigas não eram tão pacientes quanto ele; não ligavam quando ela desfilava usando a nova lingerie que tinha comprado. Decidiu se arrumar antes que Luciana telefonasse para avisar que ela já estava atrasada.
Cabelos secos, maquiagem feita e roupa no exato lugar se sentia bonita, confiante. Olhou pela última vez no espelho e suspirou. Olhou de novo o relógio - estava dentro do horário combinado. Telefonou para Luciana, que já estava chegando na porta de sua casa. Ouviu uma buzina lá fora e tirou o relógio, jogando-o no sofá, junto com ele.




*Incubus - Are you in?

22 agosto 2007

...

Eu, Tu e Ele amamos.
Vós, Nós e Eles também.
Eles se escondem.
Nós procuramos saídas para não amar.
Vós não sabeis o que fazer.
Ele costuma ser impreciso, talvez ame.
Tu amas enlouquecidamente.
Eu apenas amo indefinidamente o impreciso. O impresso. O não amar. O não amor.

16 agosto 2007

Sol, gente, fazer valer a pena e afins

E mais um dia... ensolarado! Gente, eu quero ir pro litoral. Caminhar horas a fio na beira da praia - eu juro que amo fazer isso. Queimar os mocotó e ver o entardecer... é!

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Enfim... eu não entendo gente que sai só pra constar. Aquele tipo de pessoa que é a primeira a dizer "Vamos!", antes de você dizer pra onde vai e com quem. E aí, vocês saem e a pessoa chega no local e simplesmente é como se ela não estivesse ali. Não conversa, não ri, não interage, não dança, não faz nada. Só está ali... e você nota isso por um risinho ou algum comentário. Aí chega no outro dia "Noooossaaaa, eu me diverti muuuuito ontem!". É nessas horas que eu penso que cada um tem um conceito de diversão, não é possível. Não consigo ver diversão sem interação. Mas tem gente estranha pra tudo no mundo...

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Just trying to make things better: às vêiz, mas só às vêiz, eu tenho uns arroubos de otimismo em relação a certas coisas, pessoas e situações. Geralmente deixo tudo como está e toco o barco, porque tem horas que é mais fácil conviver do que tentar entender. Mas tem horas que a gente se toca de que tem que fazer valer a pena, pelo menos por si - o lance de fazer a sua parte e o resto que se foda. E aderi a um novo mantra pra tudo: Fazer valer a pena, correr atrás e dar importância ao que importa. E duas coisas me importam muito no momento. Então, hora de dar andamento. Run, Mari, Run!

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Meu lindo contrato vai ser renovado por um ano, ou seja, vou estagiar mais um ano pagando de funcionária pública. Tou feliz com isso.

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Outra coisa: assistam 13 homens e um novo segredo. Nem tem nada demais, mas vale a pipoca. E putz, Clooney, Pitt, Garcia e Damon são tudo de bom. Até o Al Pacino... (aliás, o Pacino eu pegava em Scarface... há quase 30 anos, ui!).

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That's all, folks. Voltaremos com novos boletins durante a nossa programação.

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*É, meu bem. Ou vai, ou racha, ou não vai. Ou qualquer outra coisa. Amo.

15 agosto 2007

O Wando de cada um...

Você é luz,
É raio, estrela e luar,
Manhã de sol,
Meu iá-iá, meu iô-iô...

Gente, se apaixonar é lindo. Mas meu Deus, como a gente perde a noção das coisas e fica brega... tem horas que dá até desgosto. Aquele baita homem de quase dois metros e sisudão se transforma em algum animalzinho meigo, em bebê, em xuxu(é, com x, porque chuchu mesmo é um treco muito do sem sal pra alguém merecer ser chamado assim...) e tudo é lindo. E você vira a menina, pequena, gatinha, ou qualquer outro inha... tinha um querido que me chamava de boneca, eu achava muito engraçado. Mesmo porque, boneca é muito antigo e ele não era desse tempo; mas eu achava suuuper fofo.
E dá-lhe mensagens meiguinhas, metáforas toscas, inúmeras poesias, letras de música e afins. O Wando se apossa do seu corpo e você escreve aquele e-mail enorme, compra cartão, desenha coraçõezinhos no caderno, canta pro moço, dedica-se horas a fio numa poesia especialmente feita pra comemorar uma noite juntos e nunca é demais porque você ama. Tudo é absolutamente romântico, poético e ao mesmo tempo nonsense. Aí, depois que passa, às vezes a gente pensa e dá risada, porque o senso retorna - mas isso até se apaixonar de novo e recomeçar... e vai ser válido, lindo e tudo o mais. Porque ridículo, brega e etc, é quem não ama, não escreve, não diz. É quem passa a vida sentindo sem dizer nada, por vergonha ou qualquer outra bobagem do tipo. Vamos todos ser um pouco mais bregas, gostar mais, falar mais. Liberar o Wando de cada um e se jogar...




*Jesus, alguém por favor segura o meu lado passional? Ai... ;-) Diz que ele resolveu se apossar do corpo aqui e se manifestar...

14 agosto 2007

Luxaria...



Passeando por António Lobo Antunes....

“Nunca é agora entre nós, é sempre até domingo, até sexta, até terça, até ao próximo mês, até para o ano, mas evitamos cuidadosamente enfrentar-nos, temos medo uns dos outros, medo do que sentimos uns pelos outros, medo de dizer Gosto de ti.”

13 agosto 2007

Mean girls...

E as duas fuçando no orkut quando se deparam com a seguinte mensagem:

"Havia uma garota cega que se odiava pelo fato de ser cega. Ela também odiava a todos, exceto seu namorado. Um dia ela disse que se pudesse ver o mundo, ela se casaria com seu namorado. Em um dia de sorte, alguém doou um par de olhos a ela. Então seu namorado perguntou a ela:
- Agora que você pode ver, você se casará comigo?
A garota estava chocada quando ela viu que seu namorado era cego! Ela disse:
- Eu sinto muito, mas não posso me casar com vc porque vc é cego!
O namorado afastando-se dela em lágrimas disse:
- Por favor, apenas cuide bem dos meus olhos, eles eram muito importantes pra mim...

Nunca despreze quem ama vc..!!! Às vezes, as pessoas fazem certos sacrifícios e nós nem ligamos... Mande para o maior número de pessoas que puder , para que elas se liguem e reflitam que nesse mundo só falta AMOR ..."

E diante de tal mensagem...
- Hahahah, que cara idiota...
- Meu, ninguém merece... ahahahahhaha
- Tosco mesmo! Ficou cego e sem a mulher...
- Pior é o sem-noção que te mandou essa mensagem... deus!
- Tadinho... foi pra me comover.
- Tou vendo que você tá comovida mesmo... hahahhaha!
- Ah, mas a menina é maior cachorra...
- Tosco, tosco...
- ....
- Será que tem solução pra gente que nem a gente?
- Como assim?
- Como, como assim? Pô, era pra gente ficar comovida e achar mesmo que o mundo só precisa de amor... hahahha e o que é que a gente faz? Humor negro da pior espécie.
- Hahahahaha. Somos um caso sem solução...
- Desse jeito, no final só vai sobrar nós duas mesmo...
- Pode crer! Mas vai ser divertido!
- Como você é otimista...
- Será que só a gente é que acha graça nessas coisas?
- Acho provável que sim... pelo menos desse jeito.
- É, vai sobrar só nós duas mesmo.

Ainda ficaram rindo uma meia hora, e no fundo pensavam que seria legal se alguém doasse um par de olhos pra ambas. Olhos que as fizessem enxergar as coisas de maneira menos fria e cínica. Mas por enquanto, era divertido assim.

Opere no foda-se e seja feliz...

Heureca! Achei definitivamente o meu botão de operar no foda-se... e querem saber? Foda-se tudo mesmo. Tou em off pro mundo.

10 agosto 2007

Horizonte

E ali daquele mirante, tinha-se uma vista muito bonita da cidade e arredores. E naquele final de tarde, tudo parecia feito sob medida: a companhia, a cerveja gelada, os risos e o entardecer. Os amigos contavam histórias e riam enquanto ela parecia muito distante de tudo aquilo, com o olhar perdido em algum ponto daquele céu avermelhado de inverno. Pensava no que seria dali para frente, tinha tomado várias decisões que já estavam tornando sua vida diferente e se sentia incomodada com a maioria delas, não pelo comodismo habitual, mas porque mudar implicava em ver as pessoas de maneira diferente e, consequentemente agir de maneira diferente em relação a elas - coisa que ocasionaria vários atritos. E estava cansada deles, cansada de dar satisfações, de ter que explicar como as coisas eram, no fundo só queria ser. Não x e muito menos y, mas ser sem se preocupar se isso afetaria alguma coisa ou alguém. E nesse momento lhe pareceu uma boa idéia se jogar no meio daquele entardecer avermelhado e se perder. Só ser um tom mais, ou menos avermelhado no meio das montanhas, ou um ponto preto no meio da cidade. Ser apenas um ponto.
E sentada ali, começou a ouvir risos ao fundo, chamavam seu nome. Antes de se virar para saber o que era, sentiu um abraço apertado e um beijo no rosto.
- Ô, gatinha, tamos te chamando faz tempo... que houve? Se perdeu no meio da viagem?
- Ahn? Não, não... nada não. - sentiu o rosto queimar e sorriu.
- Acorda, gatinhaaa! Seu copo já tá vazio, assim não dá, vamos ter que beber tudo sozinhos.
- Tá bom, tá bom... vamos lá encher meu copo que tá vazio, então.
Sentiu o abraço apertar e aquela sensação reconfortante de estar em casa.
- Pensar não leva a nada. E você tá muito quietinha, não é assim. Vamo lá beber e dar risada... veem!
- Eu vou... calma!
Ele se levantou, puxou-a para cima e enganchou o braço no dela. Foram até o resto do grupo e ali ficaram rindo e comemorando a entrada do anoitecer. Certas coisas não levavam a nada mesmo, então era melhor aproveitar.

09 agosto 2007

Das conversas que eu pretendo ter com o meu futuro cachorro na sarjeta...

(fundo musical - Amy Winehouse - love is a losing game)

- Aê, Zeus, toma um trago!
(abana o rabo)
- Pô, Zeus, ele não me quer mais, a vida não presta, meu cabelo tá uma merda... toma um trago, porra!
- Au, au!
- Não, meu! Bebe aí! Você nem pra me fazer companhia... que raio de bêbado é você?!
(dando a pata)
- Não adianta me consolar... ele não vai voltar. Bebe aí!
- Auuuuuuuu!
- Affe... nem você me entende! Cachorro idiota! Sai daquiiiiiiiii!
- Cãin, cãin! (deita do lado)
- Pô, desculpa... vamos fazer as pazes? (coça a cabeça do pobre cachorro)
(lambida)
- Tá, já entendi, não precisa babar. Só você mesmo pra me entender. (choro)
- Au, au! Au!
- E você nem bebe... (terminando de matar a segunda garrafa de vodka)
(dando a pata)
(mais choro)
(deita)
(deita na sarjeta)
- Au!
- Me deixa aqui, e não sai de perto...
(abana o rabo)
(dorme)
(lambida na boca)
- Agora não, eu não te quero mais... Zeus, cadê você?
- Au! Au!
- Só você mesmo pra me entender...




*Se forem beber na sarjeta em um dia miserável, é recomendável levar o próprio cachorro...

Bê! Bê! Bê!


Benicio del Toro
Simplesmente perfeito...

07 agosto 2007

...

E quando absolutamente tudo na sua vida está uma merda... você sorri e ri de tudo. Parece a pessoa mais feliz da face da terra, finge que tá tudo certo e toca o barco. Porque no final das contas, ninguém disse que seria fácil. E parecer miserável não é interessante. Mesmo porque, ninguém vai dizer que tudo vai ficar legal, vai te ajudar a fazer alguma coisa, vai te dar colo ou simplesmente vai te fazer companhia em silêncio - como se isso mudasse alguma coisa. E sentar, chorar e ter pena de si mesmo também não resolve porra nenhuma.
Ultimamente eu ando com a vontade recorrente de ser outra pessoa. Mas passa, sempre passa. E tudo se acerta. Enquanto eu não morro e reencarno, o show tem que continuar. Hey, hey!

05 agosto 2007

O gêmeo celeste

Domingão, dez da manhã... aquele moço alto e branquelo veio puxar minhas cobertas...
- Acooooordaaaaa, neeegaaaa!
E antes de pensar em ter um surto de mau humor matinal, reconheci a voz, e ainda meio dormente e choramingando pra não levantar, reconheci os meus olhos azuis favoritos...
- Pelo amor de deus, não faz isso... deixa eu dormir mais um pouquinho só...
- Vim te ver, nega. Acooorda!
E ele saiu rindo do quarto, enquanto eu virava pro lado pra mais um cochilo. Pelo menos dessa vez ele não tinha arrancado as cobertas, pegado no colo ainda meio dormindo e carregado pela casa; e nem pulado em cima de mim. E como sempre, eu não consegui dormir mais e me levantei pra ir atrás daquele pseudo-pesadelo matinal sorrindo - sim, ele é a única pessoa que consegue me acordar em qualquer hora do dia e arrancar um sorriso(a fama dele é enooorme por causa disso). E na cozinha, estava ele lá, com o sorriso de sempre, conversando com meus pais. Momento do abraço apertado, dos beijos e de invariavelmente ele me levantar do chão e eu resmungar...
Ficamos conversando um pouco, ele me contando como estava a vida enquanto eu tomava café. Quando toquei num assunto motivo de preocupação e ligação na semana passada, foi categórico:
- Já tá tudo bem agora. Tudo resolvido...
- Que bom... disse, mas sabia que não estava. Havia algo de inquieto nos olhos, e a gente se conhece só pelo olhar. Mas se ele não havia falado, era melhor não aprofundar. Ficou mais um tempo, demos umas risadas e ele se foi, voltaria mais tarde. Abraços na despedida e piadinhas sobre a Jubiraca 4.0 - a nova bicicleta dele.

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Umas cinco da tarde, minha mãe me chamando...
-Filha, ele te disse alguma coisa? A mãe dele ligou aqui...
- Não, não disse nada, mas não tava tudo bem.
- Não voltou pra casa, a esposa ligou pra casa da mãe dele.
- Eu sei, é típico. Faria a mesma coisa.
- Vocês também, hein? Não têm juízo.
- Eu entendo o que se passa lá, somos iguais. Daqui a pouco ele reaparece, deve estar precisando de tempo pra pensar...
- Pensar no quê?
- Na vida, ué. Sabe que não adianta, ninguém consegue segurar nenhum de nós dois. Mas não esquenta... daqui a pouco tudo se resolve.
- É... mas tem que ter responsabilidade, né? Sumir assim, do nada?
- Às vezes é bom dar um tempo do mundo, faria a mesma coisa.
- Vocês não tem jeito mesmo. Como é que pode ser tão parecidos?
- Deve ser os genes...
- São do mesmo signo...
- Não, não somos. Sou de aquário e ele de peixes.
- E como é que são assim?
- Já falei, os genes. E somos livres. E o resto das coisas que a gente não explica.


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Agora a noite... pensando em nossa infância. A mesma idade, brincávamos juntos, nunca brigamos e sempre fomos cúmplices em tudo. Me lembro da prima insuportável dele, que brincava conosco nos domingos que eu passava na casa dele. Fazíamos questão de atazanar bastante a menina pra ela sair correndo pra casa dela chorando e reclamando de nós dois. Quando a mãe dela aparecia, nós já não estávamos mais no quintal, pelo menos não aparentemente. Ele se escondia trepando na pitangueira e eu, bem, como não sabia subir em árvores, me enfiava atrás das bananeiras. Depois que a mãe dela ia embora, saímos dos respectivos esconderijos pra dar risada e brincar sossegados. Quando a mãe dele perguntava o que a gente tinha feito pra menina, os dois faziam cara de anjinhos...
- Nada não. Ela é que é chorona, chata e não deixa a gente brincar em paz...
- Vocês dois juntos são fogo...

E foi assim durante toda a infância e adolescência. Um sempre entendeu o outro pelo olhar e a família toda sabe que quando os dois se juntam, não pode ser coisa boa. Passamos por todo tipo de experiência juntos, dividimos problemas, confidências, algumas broncas, conselhos. Um sempre acobertou o outro, por mais errada que parecesse a situação. E ninguém na família nunca entendeu como é que somos tão ligados, mesmo sendo muito diferentes em algumas coisas.

Agora, somos adultos com vidas completamente diferentes, mas a ligação permanece. É aquela sensação deliciosa de encontrar alguém que você não vê há muito tempo e ver que o tempo não passa pra vocês. E que por mais que o mundo seja estranho, tem alguém que te entende e que é igual a você. E que você ama e sabe que é recíproco e desinteressado; e que esse sentimento você não sabe explicar. Mas é assim.

03 agosto 2007

Vermelho pitanga

Observava aquele homem de ombros largos e mãos fortes estendido no sofá, cochilando. Não havia tirado os óculos e segurava o controle remoto da tv numa das mãos. Deitado ali, parecia um boneco de cera, sem vida - completamente diferente do homem temperamental e caprichoso que era normalmente. Com os olhos fechados, não se viam as faíscas que saíam dos olhos, nem aquele brilho no olhar que costumava ter quando estava feliz - o mesmo brilho no olhar que as crianças têm quando fazem arte ou ganham brinquedo novo. Não se ouvia a voz macia, tampouco o riso espontâneo dos dias de bom humor; só a respiração compassada. Ali, do tapete, parecia miúdo, mesmo não cabendo na namoradeira. Sua pele parecia não ter cor, sabor ou temperatura - era só um invólucro de alguém que se escondia lá dentro, alguém que ela talvez não conhecesse.

E ali, deitada no tapete, estava cansada dele. Das explosões de temperamento repentinas, do humor sarcástico, da ironia calculada daquele homem. Dos dias em que ele conseguia ser o animal mais dócil de todos e fazer dela o que quiser. Da argumentação excessiva que usava para justificar seus desejos mais tolos como se não fossem meros caprichos. Cansou-se das noites em que encostava a cabeça no peito dele e se sentia protegida; dos gestos carinhosos quando ela não esperava; do otimismo que ele fingia ter só para animá-la.

Diante do próprio cansaço, chorou - sabia que estava preparada para abandoná-lo ali, e isso doía. Doía mais ainda ver o homem de cera não esboçar nenhum movimento além de ressonar diante do choro dela. Talvez mais tarde, aquele homem com cor, sabor e temperatura viesse procurá-la, mas aí já não interessaria mais. O temperamento, os caprichos, o peito largo e o carinho já não adiantariam mais, ela já teria sido vencida pelo cansaço.

Enxugou as lágrimas, se levantou e andou pela casa. De volta ao tapete, sentou-se ao lado da namoradeira e encostou a cabeça no corpo dele. Sentiu ele se mexer no sofá, deixando o controle remoto cair e estendendo a mão em direção aos cabelos dela, enquanto a outra procurava uma mão com unhas vermelhas. Sentiu o calor de uma daquelas mãos na sua e a outra mão em seus cabelos. Nada mais fazia sentido. Adormeceu ali.