06 maio 2007

Folclore

Nesse lance de já vi de tudo nessa vida, o mais engraçado são aquelas figuras folclóricas que a gente conhece. E em cada lugar diferente, uma figura diferente. Não uma figura qualquer, mas aquelas que se tornam lendas. Numa dessas saídas de sábado a noite conheci um cara que era performer, por assim dizer. Imitava todo tipo de cantor e dançava como o Ney Matogrosso. Segundo os amigos, ele já era uma lenda na cidade e em tudo quanto era festinha ele era presença garantida e a alegria da festa. Fazia coisas insanas, dançava, brincava, fazia strip e segundo reza a lenda, até tinha ganho uma aposta comendo uma barata. Na noite em que o conheci, ele ficou dançando e conversando junto com a turminha da qual eu fazia parte no bar e ficou me chamando a noite toda de chocolate com pimenta - em referência ao cabelo extremamente escorrido chanel com franja que eu estava usando na época. Um barato.

Tinha o Baiano do gás... eu devia ter uns 15 anos e uma turminha se reunia numa praça perto de casa, e ele todo dia aparecia lá pra conversar com a gente. E ele tava sempre mais louco que o Bozo. Um sarro. Tinha o espírito extremamente jovem e virava e mexia aparecia com um vira-lata magrinho na coleira, que era praticamente um cão guia, já que ele vivia cambaleando. Às vezes ele ficava bravo com o cachorro e ia discutindo com ele pela rua.

Mas o mais engraçado e gente boa de todos os loucos que já vi pela noite era o Seu Aracy. Era da época da pracinha também. Ele dizia que o nome dele era em homenagem à Aracy de Almeida. Uma das amigas era dona do restaurante que tinha nessa praça e sempre dava uma pinguinha pra ele. E ele, em agradecimento, cantava uma música pra gente. Sempre algo do Nelson Gonçalves, Altemar ou Aracy mesmo. E a gente sempre pedia bis, ele cantava outra, ganhava outra pinga, era aplaudido e acabava no meio da roda, conversando, contando causos, dando conselho pra gente não mexer com drogas e coisas assim. Devia ter uns 60 anos na época.

Tinha a Vó também... a conheço desde que eu tenho uns 12 anos, acho. Ela sempre parava umas amigas e eu quando a gente voltava do colégio e ficava conversando, falando pra gente não se envolver com os meninos, porque tudo que eles queriam era levar a gente pra cama e só. Conforme eu fui crescendo e encontrando ela pelas ruas, os conselhos foram mudando, falava pra estudar e esquecer esse lance de casar, que primeiro eu tinha que ser alguém... ultimamente, quando a vejo, ela só pede um real "Que é pra fazer um agradinho pra Vó...". Sempre que tenho grana, dou.

Às vezes eu fico pensando em como essas pessoas viveram e vivem, mas nunca concluo nada. O engraçado é que por mais que eles contem lances sofridos da vida, tão sempre sorrindo, de bom humor e sempre dizem coisas positivas. Acho que é bem aquele lance de que não importa o que aconteça, o show tem que continuar.

Um comentário:

  1. Anônimo1:54 AM

    Vc fica chique de qq jeito, até de chanel... Com chocolate, deve ficar saborosa... kkkkk
    Vai ver essa cadelinha magrelinha, tadinha, era a reencarnação da Baleia? A cadela que pensava que era gente, que tinha alma de gente, a cadela de Vidas Secas, do Graciliano Ramos, esse Baiano o Fabiano... Eita!! Vai ver o nome dele era 'FaBaiano', a mistura de Baiano com Fabiano, o personagem, e resolveu abaianar por pura preguiça?
    A Vó, sei não... Esse não é o tipo de conselho que se dê, o melhor é a gente dar... kkkk... Levar pra cama, isso não é ruim... Pro matagal é pior, não tem o menor conforto, e pro mar então? Sal, areia...Sol... Passei dessa fase, gosto de cama, no máximo uma banheira de hidromassagem, um ofurô tb dá pro gasto e pro gosto. Risos.
    Nem que seja o show de horrores, né?
    Porque esses mesmos aí, os incluídos perversamente, ainda que inconsciente, estão num permanente movimento de busca. "Humanização e desumanização, dentro da história são possibilidades dos homens". Esse nosso caráter de inconclusos e de inacabados, nos permite por vezes esquecer que apenas humanização É a nossa vocação, uma 'vocação negada, mas também afirmada na própria negação' de humanização, de humanizar-se, de gentificar-se. Essa vocação de humanização é negada por causa da injustiça, da violência, da opressão e dos opressores. Esse esquecer-se de si, esse esquecimento do que não é, ou do que poderia ser, é de um certo modo o anseio de liberdade, de justiça que eles sequer sabem reivindicar. É a luta dos oprimidos, é a luta dos que nada têm, porque tudo lhes foi (foram) tirado, é a tentativa inconsciente de recuperar sua humanidade furtada. "A desumanização que não se verifica apenas nos que têm sua humanidade roubada, mas também, ainda que de forma diferente, nos que a roubam". Esse é um mundo dos horrores, Mari. Alice, o coelho de olhos cor-de-rosa que carrega uma algibeira no bolso do fraque e que usa cartola, e tadinho só vive apressado, a rainha de copas que por tudo corta cabeças, estão lá, aprisionados nas páginas do livro do Caroll, infelizmente. Vamos rir, porque eu também estou sem dente e quero rir de Boca escancarada no país dos banguelas e dos que nada possuem, nem dignidade.
    Um beijo e amor aos montes.

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